quinta-feira, 23 de março de 2023

 


E se eu entrei na categoria de pessoas que o sistema considera que não tem mais volta, ou seja, nunca mais conseguirão emprego? Afinal eu sou uma forte candidata, sou mulher de 45 anos, com filho, morando em uma cidade do interior de um país periférico. Sim, ainda possuo as vantagens de ser branca e com graduação completa. Enfim, estou há dois dias pensando nessa possibilidade, até como exercício mental de como é a vida de quem foi compulsoriamente “aposentada” porém sem receber aposentadoria. Como se dá esse cotidiano? Porque até agora meu cotidiano vem sendo procurar saídas para meu desemprego, desde enviar currículos para minha área a ver possibilidades de trabalhar em colheitas de tulipas na Holanda, passando por almejar uma criação de codornas, shitake, ser influencer de algum assunto aleatório, escrever mil projetos sociais e culturais, enfim...DE TUDO já passou na minha cabeça. Mas e se eu simplesmente aceitasse o fato de que não há mais trabalho, como seria acordar de manhã? Ser somente dona de casa, assistir ao Robson se virando em mil pra tentar manter as contas (o que a longo prazo seria inviável). É esse inviável que me faz persistir? É eu ainda acreditar em mim? É mostrar aos outros que eu não desisti? E se eu desistir? E se o desistir for aceitar? O que isso implicaria para a minha saúde mental? É melhor viver queimando a cabeça diariamente com ideias, soluções, currículos, projetos, esperar que o universo conspire a nosso favor (mesmo sabendo que o universo nem sabe que você existe)? Ou é melhor esvaziar a mente? Tranquilizar, entregar, relaxar e ir vivendo. Seria egoísmo meu, só ir vivendo? Privilégio eu sei que é. Enfim, dizem que é sempre bom tentar olhar as coisas por um outro prisma. Então eu estou vendo meu desemprego não mais como uma coisa temporária, que se eu diariamente me esforçar para achar o caminho, em certo momento eu vou encontrar. Agora o meu prisma é olhar o desemprego como um fato dado, não há o que fazer. C´est la vie. Vamos ver o que essa mudança de paradigma traz. Ou seja, eu sou uma esperançosa, pois até na aceitação da derrota eu espero alguma coisa (carinha de palhaça).

quinta-feira, 16 de março de 2023



Hoje eu voltei para as redes sociais. Fiquei uma semana fora das redes, foi um ótimo detox para assentar a cabeça, ficar um pouco alienada de certas coisas. Eu, por mim, ficaria mais tempo distanciada, a única coisa que senti falta foram dos memes, mas eles vêm na mesma proporção das desgraças e da superficialidade. Enfim, voltei porque uma pessoa desempregada não pode “desaparecer” por muito tempo das redes (no caso Instagram e Facebook, nunca curti Twitter e só uso Tiktok quando algum trabalho necessita). Além de “ser vista” rola muita oferta de trabalho nesses lugares, é preciso “estar atenta e forte”. Estou também no Linkedin obviamente, reformulei todo meu perfil, e todo esse processo de reformulação me fez lembrar muito do filme “ Eu, Daniel Blake”, que claramente é referência para no nome deste blog. Reformular o Linkedin não deixa de ter aquela mesma sensação de quando estamos fazendo nosso currículo, “será que tô colocando demais?, Será que vale a pena colocar isso? Como será que escrevo sobre essa experiência?”  O que agrava a situação do Linkedin é que lá você ainda tem que se adequar aos termos internacionais dos postos de trabalho, daí é uma série de estrangeirismo abarrocados, firulas conceituais, uma fábrica de encher linguiça e parecer interessante. No Linkedin todo mundo ama o trabalho que faz, no Instagram todo mundo odeia. A conta não fecha (risos). Essa semana achei que a minha definição no Linkedin estava muito sucinta, somente “Socióloga e Pesquisadora’. Resolvi mudar, colocar na chamada um pouco de tudo que já fiz, e agora estamos assim “Socióloga, Pesquisadora, Criadora de Conteúdo, Consultora Cultural, Analista de Mídias Sociais, Coordenadora de Projetos e Campanhas, Produtora de Eventos, Transcritora”. Acordei achando que estava exagerado, mas vou deixar ainda por um tempo, fiquei só com vontade de acrescentar mais uma coisa “Palhaça”. Existem várias ferramentas no Linkedin para te ajudar a melhorar seu perfil, conselheiros, coaches de carreira e outros balangandãs, mas obviamente tudo pago, e claro, desempregado não tem dinheiro né. “Ahh, mas você toma sua cerveja todo fim de semana”, alguns dirão! Sim, entre pagar para um robô do linkedin ou um coach duvidoso, eu prefiro manter a minha saúde mental, bebendo com meus amigues, coaches do meu coração. Esses estão na minha torcida, pensando ideias mirabolantes para ganhar um qualquer (a de ontem foi a ideia de fazermos almofadinhas de Totoro para vender, obrigada Bela, te amo), com esses personals da vida real eu vou levando o desemprego amparada com amor, abraços e carinho. Obrigada amigues, amo vocês.


quarta-feira, 15 de março de 2023

O dia D


Hoje é dia 15, o dia do mês que pagamos o aluguel e a fatura do cartão, o dia que o dinheiro vai todo embora e vivemos de cheque especial e do saldo do cartão. Que sorte a nossa, ainda temos crédito! Robson não gosta de pagar tudo em um só momento, paga uma coisa de manhã e outra de noite, ou paga tudo só no final do dia, pra não ter tempo de ficar remoendo o “como vamos fazer?” por muito tempo. A semana do dia 15 já é tensa, a deste mês no caso, o dia 15 caiu bem na quarta-feira, ou seja, dois dias de angústia, e dois dias se recuperando do choque. As vezes o dia 15 cai numa sexta-feira, eu prefiro, pois vamos tocando a vida, chega sexta, leva aquele baque, mas aí já é perto do fim de semana, e o balde tá ali pra gente chutar ou para recolher as lágrimas.

De qualquer forma a semana do dia 15 é sempre a semana da reflexão. As promessas não chegaram, os currículos não foram respondidos, nenhuma ideia inovadora ou empreendedora foi pra frente, não estão abrindo muitas vagas, etc. Será que o Robson vai conseguir vender mais alguma peça pra fazer um extra? Ao Robson ainda cai mais essa no colo dele, artista plástico, ele vai conseguindo aqui e ali vender uma peça de arte, mas geralmente a venda vem casada com um gasto extra, seja um problema no carro, uma manutenção na casa, uns remédios pra comprar daquele dente que tá doendo. Eu, sem talento nenhum pra vender, obviamente fico pesarosa. Robson se virando em mil pra dar conta, eu me revirando em mil pra conseguir qualquer coisa, mas o qualquer coisa nunca chega. Chega a culpa desse processo (a gente evita, mas ela sempre vem, uma culpa espreitosa, sorrateira, quando você percebe ela já tá do seu lado), o medo, chega a constatação do cansaço e do desânimo dele, chega muita coisa ruim na cabeça. Aí é hora de arrumar o que fazer, nem que seja alguma tarefa doméstica (não remunerada por essa sociedade), pra afastar a apatia, pra fechar a “oficina do diabo”. Daqui vou tentando criar uma rotina de desempregada que estou tentando organizar, ou seja, tempo de estudo, tempo de procura de emprego, tempo de desesperar, tempo de tarefas, tempo de foda-se, tempo de confiar no universo, enfim, organizar mil coisas pra não pirar. Mas tem dia ou dias que a gente pira e cai na prostração. Pra esses momentos estou tentando encaixar no máximo dois dias do mês, de preferência nos dias de TPM (risos). “Mas a vida é real de viés” já diria Caetano, as planos tem pouca longevidade.


Bilhete premiado do trabalho remoto

 



Hoje eu acordei mais proativa. Entrei em uma plataforma internacional de trabalho remoto, me candidatei para alguns projetos de avaliação de redes sociais e estou aguardando ser chamada, sem muitas esperanças na verdade, porém só o fato de ter alguma coisa que possa te solicitar já dá um ânimo para levantar e fazer as coisas. Mas a esperança de que essas candidaturas venham a ocorrer é a mesma esperança de ganhar na loteria, você sabe que não vai ganhar, mas fica pensando o que faria se ganhasse, ou seja, desvia teu pensamento para coisas boas.

Recebi desta plataforma um trabalho um tanto inusitado, enviar 10 fotos sendo 8 minha e 2 com outra pessoa. Diz que o pagamento é 3 dólares por linha. Não entendi bem o que é essa linha, acredito que seja por foto, ou pode ser só 3 dólares por tudo. Enfim, conversei com meu companheiro. Ele ficou um tanto reticente, ele tem receio desses tráfegos de dados. Eu só penso em dinheiro, se for 3 dólares por foto já dá para pagar a conta de luz, se for só 3 dólares, valeu a experiência, mais um dia tentando entender essas empresas internacionais de trabalho remoto, até onde dá para realmente confiar, até onde se concretizam os trabalhos e os pagamentos, até onde vale a pena. São curiosidades de uma socióloga desempregada, uma socióloga que sempre estudou sociologia do trabalho.

Enfim, me candidatei a esse novo trabalho, confesso que li por alto os inúmeros contratos, mas deu para perceber que as fotos serão usadas por inteligência artificial, para banco de dados, treino, etc. Eu não me importo em nada em ceder minhas fotos para este fim, ainda mais me pagando. Nossos dados já são coletados diariamente em todas as redes sociais, de graça, ou melhor, nossos dados são coletados de graça e ainda temos que assistir anúncios, ou seja, dados e trabalho de graça para as grandes corporações. Dessa vez parece que vou receber alguma coisa, mas de início a questão já está ocupando minha mente, o que é muito bom para quem vem enfrentando um desemprego desde a pandemia, com trabalhos intermitentes e mal remunerados desde então.

Atualmente estou sem nenhum tipo de trabalho, desde outubro do ano passado quando terminei um trabalho de coordenadora de campanha eleitoral. Para quem não sabe, coordenar uma campanha eleitoral é um trabalho 24h por 24h, 7 por 7 dias, é extremamente extenuante em todos os aspectos. Ao fim do trabalho em outubro, ficaram ainda algumas burocracias para resolver pós campanha, o que é normal, porém já não estava mais recebendo por isso. O que eu recebia era somente promessas, que em 2023 as coisas iriam melhorar (o que já está acontecendo e eu acredito que vai melhorar cada vez mais), porém, por mais que a gente exercite a esperança, os meses vão passando e a ansiedade vai chegando cada vez maior, ali crescendo juntinho com os juros do cartão, do empréstimo, do cheque especial. E que sorte a minha de eu ter um companheiro que ainda tem acesso a crédito! Essa ansiedade mora naquele dito popular “cabeça vazia, oficina do diabo”. Ficar desempregada, dias a fio, por mais que hajam tarefas domésticas e familiares a fazer, traz sempre pensamentos de insuficiência, de fraude, de incompletude, etc. E olha que eu sou uma pessoa com uma bela autoestima, referendada por mim (risos) e pelos meus amigos, e acho que estou na melhor época da minha vida para trabalhar (farei 45 anos em breve, 45 anos de experiência, casca, sagacidade e disposição) porém o quotidiano do desemprego corrói sorrateiramente nosso espírito, e qualquer vagalume de saída dessa situação a gente se agarra para não se apagar. Então a saga do momento é essa. “Bilhetinhos” de loteria em empresas de trabalho remoto...